O sol brilhava,na Gansolândia a calmaria.
Os gansos divertiam-se na piscina.
As galinhas na SPA de areia.
Os galos no seu cocorocó encantavam na pradaria
A Gata esticada ao sol jiboiava.
Os pássaros chilreavam e cantavam
Orquestras musicais formavam,
Passarinhando de árvore em árvore
E de flor em flor.
O vento… ai, o vento.
O vento divertia-se a fazer música com as árvores,
Levantar poeira, aqui, ali e lá na eira.
Folhas e tudo o que encontrava,remoinhos formava.
Os gansos recreiam-se na piscina
Saem correndo, batendo as asas e voando.
Que maravilha, lindo é o dia.
Tudo organizado a Gansolândia deixei,
A casavoltei.
Tintas e pinceis organizei,
Omeu trabalho continuei
Quando a Gata, nome dela,
Junto à porta, miou
Do lado de fora.
É mimada,
Não come sem eu estar perto.
Omeio ambiente natural tinha mudado, notei.
A bichanaronronava e,nas minhas pernas,
Melosamente deslizava e miava e miava.
Chamei-a para comer,mas não quis.
Às vezes é assim, caprichosa como uma criança,
A sua sorte a deixei.
O sol de repente enfraqueceu.
Aqui na serra é mesmo assim em época de chuva.
À poente, uma nuvem escura apareceu.
E de repente,
As árvores a norte
Começaram a agitarem-se furiosamente.
Fazem um barulho fantasmagórico:
“huuuuoouu,vhuuuuoooou”,
Tal como nos filmes de terror.
Há chuva,ainda bem,
Felizes vão ficar minha horta e jardim.
Entrei em casa e sons estranhos ouvi,
Inclusive um estranho assobio.
Estaria alguém?
Procurei e ninguémvi.
Para minha tranquilidade o som desapareceu.
Todavia, uma porta completamente se abriu
E outra se fechou com grande estrondo.
Levantei-me, fui ver o que se passava.
Nada de novo se viu.
Ao passar pela cozinha ouvi outroruído estranho,
Um“viiiiiuuuuuuchhviiuuu, vutatungoguuuuu”,
Igual a um Cantafera*deveraszangado.
Sem querer comecei a ficar alarmada e intrigada.
Olhei para a rua e pela janela,
Vi as árvores moverem-se furiosamente,
Tal como uma dança demoníaca.
Procurei não dar importância
Eao trabalho voltei,
Porém, uma vez mais,
Outro som, a minha atenção atraiu.
Um assobio forte, uma e outras vezes, ouvi.
Busquei a fontemas nãoachei.
Eu estava só.
Lá fora,furioso e implacávelo vento,
Às árvores fustigava
E tudo o que conseguia levava.
As nuvens poderosas taparam o sol,
Fazendo desaparecer a luz
Brilhante e cálida
Da tarde dourada.
Num ápiceadensam-se como pedras
No céu suspensas,
Negras, sombrias, tenebrosas.
E o vento? Ai o vento! Forte, ruidoso, perverso.
Tranquei as janelas, fechei todas as portas,
Mas o silvo,o assobio, o ruídoe sussurro
Sucediam-se estranhos.
Fiz de fortemeu corpo trémulo.
Lembrei-me, casas velhas almas da vida, acontece.
Possuí-me de positividade.
“ Que chova lá fora e regue minha horta e jardim”.
Mergulhada e concentrada na magia do desenho e pintura,
Um “crick, crack, crork, cronche” e um “crraappterra”,
Fizeram-me saltar alarmada da cadeira.
Tripé, tela, tintas, pinceis
E todo resto pelo chão se espalhou.
Saí da sala a correr, senti a casa a flutuar.
O vento lá fora continuavaenfurecido,
Colérico e ruidoso.
Dentro de casa “vuuuooous, huuiiiiiiiviouvuss”,
Assobios, sibilosseguiam-se.
Á rua corri para ver
O que se passava.
A Gata miava. Assustada, miava,
No seu refúgio enrodilhada.
Na Gansolândia, gansas batiam as asas
Brincando com o vento,
Galinhas e galos não gostam de chuva,
Aninharam-se no abrigo.
Não sabia o que fazer nem para onde ir.
Acreditei que estava a dormir e a ter um mau sonho.
A minha casa saía lentamente do chão.
Percebi que o vento estava a levar a casinha.
Fortementegritei: -Ó vento deixa a minha casa em paz,
Mas ele não se importou.
Voltei a gritar;
Vento maluco não leves a minha casa.
Implacável, seguiu rugindo e com mais força soprou.
Gritei por socorro,
Mas a minha voz foi abafada
Pelo som do violento vento e estrondoso.
Já chovia!Chovia,chuva forte e fria.
Corri até a um canto da casa.
Agarrei-me nas paredes com tanta garra
Como nunca imaginei, algum dia.
As minhas unhas no grosso cimento cravei
Gritava alto, muito alto e desesperada
Para o vento deixar a minha casa em paz,
Mas ele inexorável pouco se importou.
Vinha-me já o cansaço.
Os meus pés já só tinham os dedos no chão.
Era grande o meu desespero,
Mas não podia entrar em pânico.
De repente senti-me a voar com a casa,
Mas não saia do lugar. Admirada, olhei para trás
E o que vi me surpreendeu.
A minha sombra, agarrada ao velho e forte loureiro,
Dava-me apoio a partir dos meus pés.
O loureiro antes robusto,
Ameaçava fraquejar saindo da terra.
Perto de mim, uma voz ouvi:
Ó Gata deixa essa inércia,
Sai da cama e vem ajudar-me!
A gata ofendida,
Disse à sombra que não era inércia,
Tinha medo, mas era corajosaem auxílio se aventurou.
Mais uma surpresa:
Quem disse isso? Quem falou?Indaguei-me.
Mas só ouvi furioso vento,
Frio e maldoso.
Lá do seu lugar, a Gata resolveu atender a sombra.
Está bem ó sombra, eu seguro pelas raízes e uma ordem deu
Tó Toupeira seu indolente ajuda também aqui.
Tó Toupeira, tão pequenino,
Força de um judoca se convenceu,
Com a Gata concordou.
E eu? Ai e eu achei-mea enlouquecer!
Dentro de casa há ruídos estranhos.
Ovento está a levar a minha casa.
Eu agarrada a ela quase a voar.
A minha sombra presa nos meus péssegura-se ao loureiro.
O loureiro não aguenta quase sai do chão.
A sombra fala e ordena a gatinha para ajudar.
Esta, cheia de coragem, mesmo não gostando da água,
Ordena ao Tó Toupeira para ajudar
Segurandoas raízes da grande árvore.
Isto só pode ser um sonho.
Tudo estava muito difícil.
A Gata miou várias vezes em forma de código.
Momentos depois, vi toda a Gansolândia
Voando contra o vento e a chuva,
Sem medo; valentões.
O que se passa aqui? – Perguntaram em uníssono.
Venham, venham depressa ajudar,
Não aguentamos tanto.
Ajudem,
A casa está a levantar
Por causa do vento,
Ele quer levá-la.
Porquê se ela é da nossa amiga?
Perguntou uma gansa indignada.
Sabe-se lá por que é?Não importa.
O essencial é lutarmos contra o vento!
Ele não pode levar a casa que também é nossa.
Isso é verdade! Como devemos proceder?
Perguntaram todos.
Olhem, vamos nos organizar!
Gansilda e Gracilina com as vossas asas,
Ao loureiro abraceme,
Ao Tó Toupeira ajudem também.
Galinhas, galos, façam uma corrente
Eu vou para o fim de todos
O meu rabo a laranjeira agarrar.
A Gata instruiu.
Entre elesnum borburinho
Combinavam como ajudar.
Entretanto chegaram outros.
Cada um tomou a sua posição,
Toda a ajuda era pouca na minha situação.
Embora a coragem não me abandonasse,
Pensava, convicta que estava louca:
No interior com estranhos ruídos.
O vento a levar a minha casa.
A minha sombra para ajudar-me,
Agarrou-se ao forte loureiro.
O loureiro que não aguenta,
Começa a soltar-se do chão.
Por ordem da minha sombra,
A Gata vem ajudar e,
Tó Toupeira para ajudar, ela ordena.
A gata mia em código,
Toda a Gansolândia chega voando
Ditando estratégias.
O mais curioso e perplexo para mim,
Todos eles com linguagem humana.
Chovia a cântaros.
O vento não se cansava de soprar,
Notei que já estava há um metro do chão
E nós voávamos ao sabor do vento.
Miados, cacarejos, bater de asas
Num único propósito, a salvação.
Comecei a ouvir o grasnar das ganças.
Era outrasenha.
Olhei para cima e vi milhares
De grandes e pequenasasas
Batendo no céu rodeando a casa
Como um manto de veludo de todas as cores.
O tempo passou e feliz, alguém gritou.
– Olhem, olhem ali! Um círculo branco!
– O que é aquilo?
Virei-me e os meus olhos em penosas lágrimas
Em momento angustiante,
Misturadas com a água da chuva,
Viram uma bola branca. O sol.
Suave, leve, pedindo licença às nuvens para brilhar,
Prometendo-nos esperança.
As nuvens negras, agora cinzentas,
Para o sul deslizavam.
De chuva forte, agora mansachovia.
O som ruidoso e bailado agressivo das árvores,
Para o sul corriam.
Já quase o silêncio se ouvia.
Para nossa alegria,
Começamos a descer devagar para o chão.
O som do bater de asas
Era muito forte e o vento de raiva,
A sua última rajada,
Mandoue,
O seu propósito, não conseguiu.
De todos os amigos ouvi um urra de alegria
Devagar a casa, finalmente poisou no chão,
O loureiro e a laranjeira ao seu poiso voltaram.
Como é bom voltar à casa,
Disse a Gracilina batendo as asas de alegria.
O Tó Toupeira disse à gata;
Estou cansado vou para casa descansar.
O galo Galinhoao murovoou
As asas bateu e,
O seu sublime cocorocó cantou.
A passarada e aves de grande porte,
Voavam em roda cantando,
Eu feliz por estar no chão.
Com o meu coração batendo acelerado, ouvia
Na linguagem deles falarem esbaforidos e emocionados.
Não entendia nada de nada do que estava a passar, “perguntei-me”
“Estes animais falam e eu percebo, ou estou a sonhar?”
Então, pus-me a frente deles e perguntei:
– Vocês falam e eu percebo, como pode ser?
Só o silêncio respondeu.
Mais alto a perguntar voltei,
Mas em fila indiana para regresso à Gansolândia,
As gansas grasnavam,
As galinhas cacarejavam,
Os galos cantavam
E o resto das aves, no seu adeus,
Águias,
Milhafres,
Abutres,
Corvos,
Estorninhos,
Guarda-rios,
Pardais e tantos outros,
Fizeram cair uma chuva de penas
Das mais variadas cores enquanto se retiravam.
A Gata, com andar dengoso,
A ronronar para a cama foi.
E, tudo terminou.
Emocionada consegui dizer:
Obrigada a todos por existirem.
Na terra também andam anjos
Sem vocês estaria perdida.
E, lá se foram eles.
Fim
(*Cantafera* – Linguagem inventada por meu filho aos quatro anos de idade.)
“ Volkswagen Cantafera” – foi como ele pequenino classificou a viatura,
Sítio do montinho, São Julião, Serra de São Mamede, 27 de Maio de 2021
Olga G, Costa