Jorge Correia: O homem, o ferroviário e o político

Aos 80 anos, é ainda um homem activo e faz questão disso. Encontramo-lo naquele que é o seu "menino dos olhos de ouro" e ao qual tem dedicado os últimos anos, o Lar de Santo Estêvão. É no seu gabinete que Jorge Correia recebe o nosso jornal para nos falar da sua vida.

Figura emblemática de Chança, dedicou grande parte da sua vida aos caminhos-de-ferro. Iniciou-se na vida política através do sindicato e liderou durante 12 anos os destinos da Freguesia de Chancelaria, onde deixou obra feita. O amor à sua terra não deixou que ficasse parado e é actualmente presidente e utente da Associação Centro de Apoio à 3ª Idade – Lar de Santo Estêvão. A história que hoje lhe contamos é a de Jorge Correia, um menino cheio de sonhos que se transformou num homem de convicções.

Aos 80 anos, é ainda um homem activo e faz questão disso. Encontramo-lo naquele que é o seu “menino dos olhos de ouro” e ao qual tem dedicado os últimos anos, o Lar de Santo Estêvão. É no seu gabinete que Jorge Correia recebe o nosso jornal para nos falar da sua vida.

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Grande apaixonado pela Chança, na freguesia de Chancelaria, foi lá que nasceu em 1 de Dezembro de 1934 e foi na pequena escola, que altura estava instalada no actual edifício da Junta de Freguesia, que estudou a até à antiga quarta classe.

Depois de fazer o exame de admissão à quarta classe veio estudar para Portalegre para o Liceu Mouzinho da Silveira onde frequentou o 1º ano. «Fui para casa do meu padrinho que era uma figura muito conhecida em Portalegre, que actualmente dá nome a uma rua no Bairro do Atalaião, o Professor Ângelo Monteiro. Fiquei em casa dele e fiz lá o primeiro ano até que entretanto abriu o Colégio de Ponte de Sor e como para ir para Portalegre era muito longe e o novo colégio ficava aqui a meia dúzia de quilómetros fui para lá fazer o 2º, 3º, 4º e 5º ano», lembra Jorge Correia.

Filho de Domicilia Belo Calado e António José Correia, grande comerciante da época na Chança, é obrigado pelo pai a abandonar o estudos após terminar o 5º ano «talvez por questões financeira, não sei, só ele é que poderia dizer», diz-nos.

Sem poder prosseguir os estudos, Jorge Correia, na altura com 17 anos, vai trabalhar para a loja do pai, que foi o estabelecimento mais antigo de Chança.

Num altura em que as festas eram acontecimentos importantes para pequenas populações e locais de convívio e namoricos foi numas dessas festas que conheceu a sua mulher, Maria das Candeias, natural de Cabelo de Vide, e com a qual casou aos 19 anos. «Às vezes ela vinha aqui às festas e nós começamos a falar e começámos a namorar», recorda acrescentando que «casei no dia 27 de Setembro de 1954, um ano depois de a conhecer», lembra.

O casamento foi o pretexto para a sua independência e é nesta altura que decide sair da casa do pai uma vez que «comecei a ver que na casa do meu pai não conseguia realizar os meus sonhos», refere. Já com um filho nos braços e com a responsabilidade de sustentar a família, Jorge Correia, concorre a vários lugares nas Finanças, Correios e C.P, empresas públicas que na altura eram vistos como trabalhos para a vida.

Vida de Ferroviário

A C.P era o seu destino e era aqui que começava uma carreira que durou 42 anos. «Fui para a CP e estagiei aqui na Estação de Chança, durante nove meses, e depois fui para Muge, perto de Vendas Novas, fui para lá como Factor e depois fui promovido a Factor de 3ª classe e acabei por ficar por lá durante quatro anos, até que fui transferido para Ponte de Sor», conta-nos Jorge Correia.

Com uma posição boa para a época, exercendo o lugar de Factor, empregado que nas estações cuidava da expedição, recepção e entrega das bagagens e mercadorias transportadas por caminho-de-ferro, Jorge Correia começa a destacar-se pelo seu profissionalismo e em 1961 é promovido a Factor de 2ª Classe e colocado na Estação de Cête, na Linha do Douro, onde esteve durante sete anos.

A seu pedido, volta à Estação de Ponte de Sor e é por esta altura que se dá o 25 de Abril, que viria a revolucionar a sociedade e a mudar o paradigma político vivido até então. Com uma longa experiência no terreno e já com alguns conhecimentos dos caminhos-de-ferro, Jorge Correia inicia, em 1975, as funções de Dirigente Sindical dos Transportes Ferroviários, no qual tem a oportunidade de conhecer várias realidades de outros países. «Enquanto sindicalista, ligado ao Partido Comunista, chefiei a primeira delegação do sector dos transportes ferroviários à União Soviética. Fui também a Estrasburgo, integrado numa delegação em que falei sobre os Transportes Ferroviários em Portugal», recorda.

A experiência e maturidade adquiridas através do sindicato e das funções como Chefe de Estação levaram a que em 1985 fosse convidado a ir para Angola ministrar um curso de Renovação da Via como representante da Direcção de Exploração a 150 trabalhadores.

«Fui convidado pelo secretário-geral e pelo ministro dos Transportes para ir dar o curso porque os caminhos-de-ferro estavam todos partidos», refere.

Esteve em Angola durante sete meses, onde garante ter feito «um trabalho altamente positivo», apesar de ter encontrado situações de fome e pobreza que «me martirizou muito».

«Quando lá cheguei os trabalhadores tinham 1/4 de frango para comer, eu vi aquilo e fui falar com o secretário-geral para lhe dizer que o pessoal estava a passar fome e que assim não davam rendimento e disse-lhe ou lhe davam comida eu me ia embora. Quando eu disse aquilo o secretário-geral deu-me ordem para ir buscar meio frango para cada um, ou seja, eram cerca de 300 frangos. Depois disso comecei a trazer farinha, massa e arroz», relembra.

Por motivo de doença, Jorge Correia resolve vir para Portugal, a notícia espalhou-se pelos trabalhadores que «me pediram para ficar», diz-nos, acrescentado que «vocês nem sabem o espectáculo que foi no meu escritório».

Chegado a Portugal e auge da sua carreira, ingressou num curso para Inspector do Movimento, tendo-se submetido a um exame. «Eu era factor naquela altura, e decidi concorrer, fui a Lisboa fazer o exame para entrar no curso e quando lá cheguei disseram-se logo que como eu tinha estado durante sete anos nos sindicatos não devia perceber nada daquilo, mas mesmo assim eu fui», apesar de estar afastado dos caminhos-de-ferro devido ao sindicato, Jorge Correia, passou com distinção, tendo terminado com 19,8 valores. «Só não me deram 20 valores porque não me conseguiam dar um bom ordenado», diz.

Em 1996 é promovido por mérito ao cargo de Inspector Chefe do Movimento, cargo que ocupa até 1998, ano em que se reforma, após 42 anos de serviço.

O encerramento das várias linhas ferroviárias do País é visto com «muita pena» por Jorge Correia. «A C.P era um país dentro de Portugal, eu estive lá 42 anos, havia muita amizade. O que se passa agora é uma bandalheira autêntica», diz com as lágrimas nos olhos.

De Ferroviário a Político

Depois de vários anos fora regressa à Chança em 1998 apesar de dizer que «nunca deixei de cá vir». Já reformado da C.P e segundo nos diz «por ordem do partido (PCP)» concorre, ainda nesse ano às eleições para a Junta de Freguesia. «Na altura a presidente da Junta era a Pimentinha, também pelo partido, ganhei logo as eleições com maioria absoluta comecei a trabalhar», diz Jorge Correia. Durante o primeiro mandato que terminou em 2001, fez várias obras, no entanto, achou que «ainda tinha muito por fazer» e decide concorrer novamente.

É no segundo mandado que Jorge Correia desenvolve grandes obras que marcaram o seu mandato desde logo a construção da ETAR, o arranjo do Rossio, a construção do complexo de piscinas e a renovação do antigo edifício da escola, onde posteriormente foi instalada a sede da Junta de Freguesia.

Em cerca de 12 anos de trabalho em prol da comunidade, Jorge Correia considera que fez um trabalho «muito positivo».

Presidente e utente do lar

Depois de 12 anos como autarca, Jorge Correia não parou e em 2006 candidata-se a presidente da Associação de Apoio à 3ª Idade – Lar de Santo Estêvão, cargo que actualmente ainda exerce.

«Agarrei este projecto com unhas e dentes», diz-nos Jorge Correia visivelmente orgulhoso do trabalho desenvolvido até aos dias de hoje. Entre o trabalho desenvolvido destaca-se o facto de ter conseguido construir a valência de lar da Instituição, e mais recentemente impulsionou a ampliação do 2º piso do edifício, que foi inaugurada no dia 27 de Fevereiro deste ano pelo ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, Pedro Mota Soares.

«Isto não é um lar e é um hotel de quatro ou cinco estrelas», diz-nos enaltecendo o papel da instituição para a freguesia, uma vez que é «o maior empregador da terra» com 34 empregados e cerca de 70 utentes na valência de lar e serviço domiciliário.

Para além de presidente, Jorge Correia assume ainda o papel de utente no lar desde final de Dezembro e garante que enquanto presidente esta situação traz benefícios, uma vez que «estou 24 horas no lar, e como tal estou sempre em cima do acontecimento», refere.

Apesar do trabalho feito e dos seus 80 anos, Jorge Correia garante que vai continuar a ser presidente pelo menos até que «a saúde o permita», conclui.

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