Após uma estreia auspiciosa em Arronches em 2024, o Festival Terras sem Sombra regressa a 17 de Maio a este território do Alto Alentejo com um programa que alia a grande música de inspiração mariana aos traços patrimoniais da região. O concerto da noite de sábado propõe a itinerância por um repertório musical atento às múltiplas dimensões da vida de Nossa Senhora: a jovem mãe, a rainha celeste, a intercessora compassiva, a mulher glorificada. Vai actuar um dos mais interessantes coros litúrgicos da actualidade, a Schola Cantorvm Colegiada de Cedofeita, do Porto, sob a direcção musical de Nuno Miguel de Almeida. Já a componente patrimonial convida-nos a recuar cinco milénios, na visita a um dos mais notáveis conjuntos de arte rupestre em Portugal, tendo como orientador o arqueólogo e professor universitário Manuel Calado.
Nesta apresentação em Arronches, o TSS conta com a parceria do município local. De salientar também o regresso, em 2025-2026, ao apoio sustentado da Direcção-Geral das Artes, obtido mediante concurso público.
Um concerto de profundo significado cultural e simbólico
No mês consagrado a Maria, o concerto de sábado, 17 de Maio (21h30), na igreja matriz de Arronches, exalta a Mãe, a Rainha e a intercessora. Sob a direcção musical de Nuno Miguel de Almeida, a Schola Cantorvm Colegiada de Cedofeita conduz-nos numa viagem musical que começa na solenidade do canto gregoriano, atravessa os refinamentos da polifonia renascentista, barroca e romântica e desemboca na vibrante linguagem da criação contemporânea. Um périplo ao longo de dez séculos em que a figura da Mãe de Deus se revela sob múltiplas luzes – ora na contemplação serena, ora na súplica ardente –, através de obras de Tomás Luis de Victoria, Gregor Aichinger, Zoltán Kodály, Jeff Enns, Ēriks Ešenvalds, entre outros.
Figura incontornável do imaginário espiritual e artístico do Ocidente, a Virgem tem constituído uma fonte inesgotável de inspiração musical desde os primórdios da Cristandade. «Sob o Teu Manto: Aspectos da Vida de Nossa Senhora na Música (Séculos XI–XXI)» é, assim, um tributo mariano, onde o sagrado se faz canto e a arte se torna oração.
Fundada em 2018 por Nuno Miguel de Almeida, a Schola Cantorvm Colegiada de Cedofeita, sediada na igreja de São Martinho de Cedofeita (Porto), dedica-se à música sacra no contexto litúrgico, combinando grandes repertórios do passado e criação contemporânea. Com vozes maioritariamente femininas, também actua em formação mista, primando pelo rigor estético e espiritual. Lançou em 2021 o ciclo Serões na Música Litúrgica, com nomes de referência neste âmbito. Tem realizado igualmente projetos pouco usuais no panorama musical português, como Tenho Sede (2022) e A Cidade dos Dois Sóis (2024). Interpretou obras de Eurico Carrapatoso e Benjamin Britten. Participa regularmente em festivais nacionais e internacionais, mormente FIMUV e Cistermúsica.
Natural do Porto (1993), Nuno Miguel de Almeida estudou Piano, Órgão e Composição, licenciando-se em Direcção e Formação Musical pela Universidade de Aveiro. Mestre em Direcção Coral, tem dirigido vários agrupamentos, integra a equipa da Orquestra Sinfónica de Leiria e lidera a Schola Gregoriana de Cedofeita e os Moços do Coro, actuando regularmente em Portugal e no estrangeiro.
Um notável quadro da arte rupestre alentejana
A anteceder o concerto, a tarde de sábado (15h00) convida os participantes na actividade de Património a enveredar pela freguesia de Esperança. Com ponto de encontro no Centro Interactivo da Ruralidade de Arronches, a iniciativa tem por mote «Territórios Rituais: A Arte Rupestre na Freguesia de Esperança» e desvela um dos mais notáveis conjuntos de arte rupestre esquemática em Portugal. Datadas do Neolítico e Calcolítico, estas pinturas, com cerca de 5000 anos, oferecem um vislumbre da vida e espiritualidade das comunidades agro-pastoris que habitaram outrora a região.
O Abrigo de Vale de Junco, também conhecido como Lapa dos Gaivões, é o mais emblemático destes sítios. Descoberto em 1914, exibe figuras antropomórficas e zoomórficas, impressões de mãos e símbolos geométricos, predominantemente em tons de ocre vermelho. As representações sugerem cenas de pastorícia e rituais simbólicos, reflectindo a organização social e as crenças das populações pré-históricas.
Na região existem outros abrigos significativos, como o de Pinho Monteiro, descoberto em 1981 na Serra da Cabaça, e a Lapa dos Louções. Estes locais revelam pinturas semelhantes, reforçando a importância cultural e arqueológica da área.
A actividade é orientada por um grande conhecedor do tema, o arqueólogo Manuel Calado, professor da Universidade de Lisboa, especializado no estudo do Megalitismo e da Pré-História europeus, com especial foco na Península Ibérica. Ao longo da sua carreira, tem investigado monumentos como antas, cromeleques e arte rupestre, contribuindo para a valorização e compreensão do património arqueológico nacional. É autor de diversos artigos e livros de referência sobre sociedades pré-históricas e práticas funerárias
Sublinhe-se que devido ao ato eleitoral de 18 de Maio próximo, a habitual actividade de domingo, dedicada à Salvaguarda da Biodiversidade, foi cancelada.
O TSS prossegue a sua programação a 7 a 8 de Junho com um fim-de-semana em Castelo de Vide. No sábado (15h), a visita de património – «’Não Hei-de Dizer Senão a Verdade’: Garcia de Orta no seu Museu» – celebra a vida e o legado deste notável filho da terra. À noite (21h30), o virtuosismo do canto coral filipino apresenta-se em todo o seu esplendor com os The Philippine Madrigal Singers e no domingo, 8 de Junho (9h30), a actividade de salvaguarda da biodiversidade detém-se no tema «Entre a Medicina e a Gastronomia: Plantas Terapêuticas e Aromáticas da Serra de São Mamede».
Toda a programação da presente temporada pode ser consultada no site do Festival Terras sem Sombra. As iniciativas são de acesso livre e gratuitas.