Temos casa de família no Pisão que utilizamos regularmente ao longo do ano, não residimos, mas fazemos parte desta família que infelizmente, com o tempo vai sendo cada vez mais reduzida. Estamos integrados na vida da aldeia, eu própria integro a Direção da Pró-Associação de Residentes e Proprietários do Pisão, que está empenhada no processo de Realojamento da Aldeia, embora, deva realçar que este texto seja de minha iniciativa pessoal e motivado pela indignação do que,entretanto,está a acontecer.
Durante anos, o Alto Alentejo tem vivido entre promessas e adiamentos. A Barragem do Pisão surgiu como uma luz ao fundo do túnel — uma oportunidade para contrariar o abandono, criar vida, trazer de volta a esperança a uma região esquecida.
Mas, mais uma vez, essa esperança vê-se travada por um novo bloqueio ambientalista. Um bloqueio que ignora por completo a realidade de quem vive nesta terra. É fácil falar de equilíbrio ecológico à distância, sem sentir o peso da ansiedade, do cansaço e da frustração de ver o futuro travado por decisões tomadas longe do terreno.
Este novo bloqueio ambientalista não é só mais um entrave técnico — é uma ferida profunda no coração da comunidade local. A cada obstáculo, a cada parecer que retarda o projeto, a incerteza cresce. As pessoas deixam de acreditar. Deixam de fazer planos. Adiam obras nas suas casas, com medo de desperdiçar recursos. Evitam investir, vivem suspensas, sem presente, e sem saber que futuro as espera.
A descrença causada por estes adiamentos está a afastar também aqueles que partiram para outras paragens, mas que nunca quiseram perder a ligação à sua terra. Muitos mantêm a casa construída, o vínculo ao Pisão, como uma esperança viva de regressar um dia. Mas essa esperança está a esmorecer, porque sem decisões concretas, o sonho de voltar torna-se cada vez mais difícil de manter.
Já foram feitas várias intervenções, vários anúncios de que “é agora”. E, várias vezes, tudo voltou atrás. Esta repetição de desilusões é uma violência silenciosa que corrói a crença de quem habita esta região. O sentimento de impotência é real e profundo.
A proteção do ambiente é fundamental, mas não pode ser usada como desculpa para travar soluções que devolvem dignidade e esperança a uma região inteira.
É necessário ouvir quem vive aqui, compreender que o equilíbrio verdadeiro é aquele que protege a natureza e, ao mesmo tempo, defende as pessoas, as famílias e o direito a uma vida com condições dignas.
Por isso, faço um apelo aos ambientalistas: escutem a voz das populações que sofrem com a seca, com o abandono e com a falta de soluções para a sua vida, ouçam a população do Pisão, que há décadas assiste a um desenvolvimento adiado da sua aldeia. Entendam que proteger o ambiente e proteger as pessoas não são objetivos opostos — são parte do mesmo desafio. É possível defender a natureza sem impedir que esta terra tenha um futuro digno.
O meu sentimento, que também é generalizado na população da aldeia do Pisão é o de que não podemos continuar à espera — dizemosnão a mais bloqueios ambientais que apenas prolongam o sofrimento e o adiar da vida daqueles que durante largos anos vivem entre a ilusão de uma nova casa e o sofrimento resultante do alagamento dasua aldeia.
Isabel Miranda (habitante do Pisão)
Nt. – foto de arquivo

